Lc 1.26-33, 39-45
INTRODUÇÃO
Nesta presente
lição traremos a definição das palavras “dessacralização e aborto”; veremos
algumas legislações não cristãs contrárias a prática do aborto; notaremos o que
a Bíblia diz sobre esta prática; pontuaremos algumas concepções errôneas para
justificar o aborto; e por fim; falaremos o que a Bíblia diz sobre a vida
humana.
I.
DEFINIÇÃO DAS PALAVRAS “DESSACRALIZAÇÃO”, “ABORTO” E “FETO”
1. Definição dos
termos “dessacralização” e “aborto”.
A palavra
“dessacralização” significa: “fazer perder o caráter sagrado” (HOUAISS,
2011, p. 1015). O Dicionário Online de Português define dessacralização como: “secularização,
desmistificação, fazer com que algo deixe de ser considerado sagrado, divino,
inviolável” (www.dicio.com.br/dessacralizacao/). Já a palavra “aborto”
é formada por dois vocábulos latinos: “ab”, privação, e “ortus”,
nascimento (ANDRADE, 2015, p. 52). “Conceitualmente, o aborto é a interrupção
do nascimento por meio da morte do embrião ou do feto. Algumas literaturas
identificam o aborto como feticídio cujo significado é a morte do feto”
(BAPTISTA, 2023, p. 60). O verbo “abortar” do ponto de vista
médico significa: “expulsar naturalmente o feto, ou retirá-lo por meio
artificiais […]” (HOUAISS, 2001, p. 1271). O aborto é chamado de
feticídio que significa: “crime, no qual através do aborto provocado,
ocorre a morte do feto que se presume com vida” (HOUAISS, 2001, p.
1333).
II.
LEGISLAÇÕES NÃO CRISTÃS CONTRÁRIAS A PRÁTICA DO ABORTO
As civilizações
dos sumérios, os babilônios, os assírios, os hititas e os israelitas consideravam
o aborto como um crime de maior gravidade (GARCIA, 2011, p. 25 apud BAPTISTA,
2018, 39). Ao contrário do que pensam os pró-aborto que somente os cristãos se
opõem a esta prática pecaminosa, o aborto já foi declarado errado por muitas
sociedades não cristãs. Vejamos:
- Código de Hamurabi (XVIII a.C.) aplicava castigo severo para quem induzisse um aborto (GEISLER, 2001, p. 456);
- Tiglath-Pileser rei persa (XII a.C.) punia as mulheres que induziam o aborto (GEISLER, 2001, p. 456);
- Hipócrates médico grego (IV a.C.) se opunha ao aborto (PALLISTER, 2005, p. 141). O juramento era recitado pelos médicos no dia da formatura dizia: “Não darei a nenhuma mulher um pessário para provocar um aborto” (KAISER JR, 2016, p. 138);
- Lucius Sêneca (II d.C.) elogiou a sua mãe por não ter lhe matado com esta prática (GEISLER, 2001, p. 456);
- Código criminal do Império no Brasil. O aborto e o infanticídio eram punidos com prisão e trabalho forçado. A pena era de um a três anos de prisão e trabalho forçado (Art. 198) […], de um a cinco anos de trabalhos forçados no sistema prisional da época (Art. 199) […]. Código de Napoleão (1769-1821) era crime hediondo (BAPTISTA, 2018, p. 40).
III.
O QUE A BÍBLIA DIZ SOBRE O ABORTO
A vida humana é
sagrada por tratar-se de um ato criativo de Deus (Gn 2.7; Jó 12.10) […]. O
princípio de sacralidade assegura a dignidade da pessoa humana e a
inviolabilidade do direito à vida (Sl 36.9; 90.12) […] a militância ideológica
não reconhece que a sacralidade da vida está atrelada à santidade da vida […]. Essa
falaciosa distinção condena o homicídio de crianças já nascidas, mas defende o
assassinato dessas crianças no ventre da mãe. (BAPTISTA, 2023, pp.
61,62). Vejamos o que nos diz a Escritura:
1. O aborto no
Antigo Testamento.
Na Lei Mosaica,
provocar a interrupção da gravidez da mulher é ato criminoso (Êx 21.22,23). No
Decálogo, o sexto mandamento proíbe o homem de matar, o que significa
literalmente “não assassinar” (Êx 20.13). Os intérpretes do
Decálogo concordam que o aborto está incluso nesse mandamento. Então, quem mata
um embrião ou feto atenta contra a dignidade humana e a sacralidade da vida no
ventre materno (BAPTISTA, 2023, p. 60). O aborto é um assassinato porque ele
termina com uma vida humana, portanto neste mandamento encontramos uma clara
reprovação a este ato (Êx 23.7; Dt 5.17). Em Êxodo 21.22-25 dá a mesma pena a
alguém que comete um homicídio e para quem causa o aborto. Deus trata o feto
como um ser humano (Gn 9.6). A Lei de Deus não faz distinção entre aborto
e infanticídio. Tanto faraó que ordena a matança dos infantes hebreus, quanto a
mulher que, por motivos fúteis, interromper a gravidez, quebrantam o sexto
mandamento (Êx 1.22; 20.13) (ANDRADE, 2017, p. 77)
2. O aborto no
Novo Testamento.
Jesus ratificou o
sexto mandamento “Não matarás” (Mt 5.21; 19.18). Os apóstolos
também (Rm 13.9; Tg 2.1). Uma das afeições próprias da natureza humana, é que a
mãe ame o filho, desde o seu ventre (Is 49.15). No entanto, Paulo diz que umas
das características do ser humano entregue ao pecado, é que ele pode se tornar
uma pessoa “sem afeição natural” (Rm 1.31), uma referência
implícita ao desamor que sente, por exemplo, uma mulher que estando grávida, assassina
o próprio filho. O mesmo apóstolo diz que os que tais coisas cometem e também
os que consentes são dignos de morte (Rm 1.32 ver ainda Ap 21.8).
3. O aborto na
história da Igreja.
A igreja que
mantém o princípio teológico da autoridade bíblica (2Tm 3.16) defende a dignidade
humana, a sacralidade e a inviolabilidade da vida desde a sua concepção (BAPTISTA,
2023, pp. 63,64). “O ensino dos dez apóstolos” (séc. I), chamado de “Didaquê”,
condena o aborto: “Não matarás o embrião por aborto e não farás perecer o
recém-nascido” (Didaquê II,2). O apologista Tertuliano (150-220) ensinou que a
morte de um embrião tem a mesma gravidade do assassinato de uma pessoa já
nascida e que impedir o nascimento é um homicídio antecipado. O polemista
Agostinho de Hipona e os teólogos Jerônimo de Estridão e Tomás de Aquino
consideravam pecado grave interromper a gestação e o desenvolvimento da vida
humana […]. Jerônimo, autor da vulgata latina, considerou as mulheres que
escondiam a infidelidade conjugal com o aborto como culpadas de triplo crime: adultério,
suicídio e assassinato (ANDRADE, 2015, p. 58 apud BAPTISTA,
2018, pp. 43,44).
IV.
CONCEPÇÕES ERRÔNEAS PARA JUSTIFICAR O ABORTO
“Fecundação,
embrião e feto são os nomes das três etapas da gestação […]. Quanto aos cientistas,
muitos concordam que a vida tem início na fecundação, quando o espermatozoide
(gâmeta masculino) e o óvulo (gâmeta feminino) se fundem gerando a nova célula
chamada zigoto” (BAPTISTA, 2018, p. 44). “De fato, o homem, desde a fecundação,
não é ‘um aglomerado de células’, como dizem os cientistas ateus
e materialistas. É um ser completo, composto de espírito, alma e corpo”
(RENOVATO, 2008, p. 273).
1. O feto não é
plenamente humano.
Alegam os
pró-abortistas que o feto não é um ser humano em potencial, podendo ser
facilmente descartado. No entanto, tanto as descobertas científicas quanto a
Bíblia nos mostram que isto é um argumento falacioso. A palavra “feto” segundo
o Houaiss (2001, p. 1333) significa: “ser em desenvolvimento no útero
[…]”. As únicas diferenças entre “um feto” e um ser
humano adulto, é a idade e a massa corpórea. Portanto, ele é tão pessoa quanto
um ser humano nascido. Do ponto de vista bíblico, Deus não faz distinção entre
vida em potencial e vida real, ou seja, entre uma criança ainda não nascida no
ventre materno em qualquer que seja o estágio e um recém-nascido ou uma
criança. No AT a expressão “yeled” é usada normalmente para se
referir a uma criança já nascida. Mas, também é utilizada para se referir a um
filho no ventre (Êx 21.22; 25.22). No NT a palavra grega “brephos” é
empregada com frequência para os recém-nascidos, para os bebês e para as
crianças mais velhas (Lc 2.12,16; 18.15; 1Pd 2.2). Em Atos 7.19, “brephos”
refere-se às crianças mortas por ordem de Faraó. Mas em Lucas 1.41,44 a
mesma palavra é empregada referindo-se a João Batista, enquanto ainda não havia
nascido.
2. O feto não tem
alma.
Há evidências
científicas e bíblicas de que a alma (vida) humana começa na concepção. Norman
Geisler (2001, p. 453) citando a Dra Matthew-Roth da Faculdade de Medicina de
Harvard diz que: “na Biologia e na Medicina, é fato aceito que a vida de
qualquer organismo individual que se reproduza por forma sexuada inicia no
momento da concepção, ou da fertilização”. Do ponto de vista bíblico, a
origem da vida inicia na concepção (Sl 139.13-16; Jr 1.5; Zc 12.1-b; Lc 1.41).
Renovato (2008, p. 274) diz: “cada vez que um gameta masculino funde-se com um
feminino, no casamento, ou fora dele, pela lei do Criador, forma-se um conjunto
espírito + alma dentro do homem”. Para Deus, o embrião não é “só um
punhado de tecidos”; ao contrário, Deus já sentia afeto e amor por nós
quando estávamos sendo tecidos dentro do ventre de nossa mãe (KAISER JR, 2005,
p. 146). Hoje em dia: “O direito à vida intrauterina é substituído pelo direito
incondicional da mulher sobre o próprio corpo, que, por meio do aborto, decreta
a morte do fruto do seu ventre” (BAPTISTA, 2023, p. 59).
3. A mulher tem
direito sobre seu próprio corpo.
Este é o principal
argumento do movimento feminista: “meu corpo, minhas regras”. No
entanto, é necessário fazer algumas considerações. Vejamos: (a) do ponto de
vista jurídico: o aborto ainda é crime no Brasil. A conduta de aborto esta
tipificada pelo Código Penal Brasileiro entre os artigos 124 e 126. Trata-se de
um crime contra a vida; (b) do ponto de vista científico: é bom destacar
também que o feto não é prolongamento do corpo da mulher. Dados científicos
mostram que “a partir da concepção eles tem o seu próprio sexo, que pode
diferir da mãe; depois de quarenta dias da concepção tem as próprias ondas
cerebrais; após algumas semanas já possuem seu próprio tipo sanguíneo, que pode
ser diferente da mãe, e suas próprias impressões digitais” (GEISLER, 2017, p.
160). Logo, é um indivíduo dentro de outro; (c) do ponto de vista de saúde
pública: se ignora as complicações, danos e consequências emocionais,
psicológicas e físicas desta prática; e, (d) do ponto de vista bíblico: a
violência contra o corpo de outrem é pecado (Gn 9.6; Êx 20.13; Mt 5.21; Rm 13.9;
Tg 2.11).
4. O aborto é
justificável em algumas situações.
O aborto é
proibido no Brasil, apenas com exceções quando há risco à vida da mãe, quando a
gravidez é resultante de um estupro e se o feto não tiver cérebro (anencefalia).
Nesses três casos, permite-se à mulher optar por fazer ou não o aborto. No
entanto, a Bíblia se posiciona contrária ao aborto mesmo nestas situações, pois
nada justifica a morte de um inocente (Dt 19.10; Sl 106.38; Jr 2.34).
Não temos o direito de escolher quem deve ou não viver, isto compete
exclusivamente a Deus, que é o autor da vida (Gn 2.7; Sl 139.13-16; Jó 33.4). O
Código Civil, em vigor desde 2002, ao tratar da “personalidade e da
capacidade”, protege a vida desde a concepção ao legislar que “a
personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a
salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro” (Art. 2º do
CC). Esse dispositivo é interpretado por diversos civilistas do seguinte modo:
“[…] entendemos que na verdade o início legal da consideração jurídica da
personalidade é o momento da penetração do espermatozoide no óvulo” (DINIZ,
2012, p. 102). Pode-se [...] considerar o início da vida na concepção e
assim caracterizar o aborto como atentado à vida (BAPTISTA, 2018, p. 49).
V.
O QUE A BÍBLIA DIZ SOBRE A VIDA HUMANA
1. A vida humana é
um dom de Deus.
A vida é um dom de
Deus e um feto tem vida. Paulo diz que é Deus “quem dá a todos a vida, e
a respiração, e todas as coisas” (At 17.25). É Ele quem forma o corpo
humano no ventre (Sl 139.13). Ana cantou: “O SENHOR é o que tira a vida e
a dá; faz descer à sepultura e faz tornar a subir dela” (1Sm 2.6). Veja
ainda (Jó 1.21; 33.4; Sl 31.15; Jo 1.3).
2. A vida humana é
sagrada.
A vida quer no
estágio inicial ou no terminal, é sagrada aos olhos de Deus (Nm 16.22). Quando
Deus fez o ser humano o fez segundo a Sua imagem e semelhança (Gn 1.26). Até
mesmo depois do pecado esta imagem e semelhança não foi erradicada (Gn 9.6; Tg
3.9). O corpo é templo do Espírito Santo (1Co 3.16; 6.19; Tg 4.5). O valor da
vida não depende dos anos acumulados, nem da capacidade física ou intelectual
da pessoa. A vida é um bem pessoal, intransferível e incalculável (Mc 8.37).
3. A vida humana
deve ser respeitada e protegida.
Dos Dez
Mandamentos, seis dizem respeito ao nosso compromisso com o próximo (Êx
20.12-17). Portanto, o sexto mandamento “Não matarás” (Êx 20.13),
se constitui numa agressão contra a vida alheia. Não podemos furtar o direito
do outro de viver. E, em se tratando de um “feto” há ainda muitos
agravantes, pois este pequeno ser não pode gritar por socorro, nem pode se
defender, tampouco fugir. Acrescenta-se ainda que ele não pediu para vir ao
mundo. Em caso de estupro “a adoção e não o aborto é a melhor
alternativa” (GEISLER, 2017, p. 165).
CONCLUSÃO
Enquanto as
legislações de vários países estão legalizando a prática de aborto, nós
cristãos permanecemos sob a égide da Palavra de Deus, que é nosso código de
conduta imutável e absoluto. Somente Deus, que criou o homem à sua imagem, tem
o direito de pôr fim à vida humana, seja de um ser humano em gestação ou já
nascido.
REFERÊNCIAS
Ø ANDRADE,
Claudionor Corrêa de. As novas
fronteiras da Ética Cristã. CPAD, 2010.
Ø BAPTISTA,
Douglas. A Igreja de Cristo e o
Império do Mal: Como Viver neste
Mundo Dominado pelo espírito da Babilônia. CPAD, 2023.
Ø BAPTISTA,
Douglas. Valores Cristãos: Enfrentando as Questões Morais de Nosso Tempo.
CPAD, 2018.
Ø GEISLER,
Norman. Ética Cristã: Opções e Questões Contemporâneas. VIDA
NOVA, 2015.
Ø HOUAISS,
Antônio. Dicionário da Língua
Portuguesa. OBJETIVA, 2001.
Ø STAMPS,
Donald C. Bíblia de Estudo Pentecostal.
CPAD, 1995.
Ø PALLISTER,
Alan. Ética Cristã Hoje. São
Paulo: Shedd Publicações, 2015.
Ø KAISER
JR, Walter. O Cristão e as Questões
Éticas da Atualidade: Um Guia
Completo para Pregação e Ensino. Editora Vida Nova, 2022.
Por
Rede Brasil de Comunicação.