At 4.32-35; Lc
10.30,36,37
INTRODUÇÃO
Nesta lição
veremos que não somos salvos pelas boas obras, mas as praticamos porque somos
salvos (Mt 5.16); traremos uma definição dos termos “obras” e “misericórdia”;
estudaremos as obras de misericórdia ilustradas no bom samaritano; pontuaremos
a Igreja apostólica e a prática das obras de misericórdia; notaremos as obras
de misericórdia como uma evidência da salvação; e por fim, analisaremos a
responsabilidade do crente no cuidado com os pobres e necessitados a luz da
Bíblia.
I. DEFININDO OS
TERMOS OBRAS E MISERICÓRDIA
1. Obras. Nas Escrituras várias são as palavras
usadas traduzidas como “obra”, entre estas uma das
principais é o substantivo hebraico: “maaseh” que significa: “trabalho,
obra, ação, labor, labuta, comportamento”. A palavra obra no grego é: “ergon”
denota: “trabalho, ação, ato”. Ocorre frequentemente indicando as ações
humanas, boas ou ruins (Mt 23.3; 26.10; Jo 3.20,21; Rm 2.7,15; 1Ts 1.3; 2Ts
1.11). “Atrelada a vida cristã, obras são as
evidências de uma fé viva e eficaz, de modo que o apóstolo Tiago afirma
que pelas obras, atesta-se a qualidade da fé” (Tg 2.17,26) (ANDRADE, 2006, p.
282 – acréscimo nosso).
2. Misericórdia.
Esta palavra na língua portuguesa advém do latim: “merces, mercedis”.
Segundo o dicionarista Houaiss (2001, p. 1933) misericórdia é: “o
sentimento de dor e solidariedade com relação a alguém que sofre, acompanhado
do desejo ou da disposição de ajudar essa pessoa; dó, compaixão, piedade; ato
concreto de manifestação desse sentimento, como o perdão; graça, clemência; benefício
que se presta a um sofredor”. No AT a palavra para misericórdia é: “hesed”,
ocorrendo cerca de 240 vezes, significando: “benignidade, amor firme, graça,
misericórdia, fidelidade, bondade, devoção” (Sl 23.6; Pv 19.17; 22.9;
Js 2.12-14; Jr 3.13). No NT o termo correspondente é: “eleos” que quer dizer: “manifestação
exterior de piedade; presume necessidade por parte daquele que recebe, e
recursos adequados para satisfazer a necessidade por parte daquele que a mostra”
(Mt 9.13; 12.7; 23.23; Lc 10.37; Tg 2.13) (VINE, 2010, p. 793).
II. AS OBRAS DE
MISERICÓRDIA ILUSTRADAS NO BOM SAMARITANO
1. As obras de misericórdia como uma ação altruísta.
Segundo o
dicionário (2001, p. 171) a palavra altruísmo,
quer dizer: “sentimento de quem põe o interesse alheio acima do próprio”, ou
seja, uma pessoa altruísta está mais preocupada com o interesse do próximo do
que com o seu. O samaritano colocou sua agenda pessoal em segundo plano para
servir. Ele “[…] ia de viagem […]” (Lc 10.33), tudo ficou para
trás: viagem, negócios, perigo de assaltantes, para salvar aquele homem
agonizante. A Bíblia nos ensina sobre a lei da semeadura (Lc 6.38). O samaritano
prestou um imediato socorro emergencial aquele homem; levou-o para uma
hospedaria; pagou a conta antecipadamente; e, ofereceu mais assistência caso fosse
necessária. O altruísmo não busca os seus interesses (At 20.35; 1 Co 13.4,5; Fp
2.4). A Bíblia diz que quem despreza o seu próximo peca (Pv 14.21), e que os
misericordiosos são bem-aventurados (Mt 5.7 ver Sl 41.1; Is 58.10).
2. As obras de misericórdia como uma ação empática.
Devemos exercer
misericórdia com alegria, pois a ação deve ser acompanhada da intenção, ou caso
contrário, será apenas um ritual vazio (Rm 12.8), e sem a intenção de sermos
vistos (Mt 6.1-4). Um sentimento que fica evidenciado no samaritano é a
empatia, ou seja, “a ação de se colocar no lugar de outra pessoa, buscando agir ou pensar
da forma como ela pensaria ou agiria nas mesmas circunstâncias” (Lc
6.31; 33). O samaritano não procurou saber quem era o necessitado a sua frente,
sua religião ou mesmo a sua nação; agiu como que o que se passava fosse com ele
mesmo ou um dos seus. Quando temos este amor de Deus servimos bem a todos,
servimos bem à obra do Senhor, sem interesse em qualquer recompensa (Mt 7.12
ver ainda Lv 19.18; Mt 22.39,40; Rm 13.8,10). A ajuda deve ser prática, e não
deve consistir simplesmente em sentir pena da pessoa (Tg 2.14-17). É provável
que o sacerdote e o levita sentiram algum tipo de dó pelo ferido, mas não
fizeram nada. A compaixão, para ser verdadeira, deve gerar atos (1 Sm 30.11-13;
Tg 2.26; 1Jo 3.17,18).
3. As obras de misericórdia como uma ação imparcial.
Devemos ajudar
qualquer que precise, inclusive o inimigo (Rm 12.13,14,20). Quando o doutor da
Lei perguntou a Jesus: “quem é o meu próximo” (Lc 10.29), Jesus
contou-lhe então a parábola do bom samaritano, demonstrando que o verdadeiro
amor não faz acepção de pessoas (Tg 2.1,8,9); pois, o homem que havia sido
assaltado e espancado não foi ajudado pelo sacerdote e nem pelo levita, mas,
foi socorrido por um samaritano, que não olhou para sua nacionalidade (Lc
10.25-37). Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos são
os dois maiores mandamentos na Lei (Mt 22.34-40; Mc 12.28-34; Lc 10.25-27). A
acepção de pessoas é uma atitude contrária à misericórdia (At 10.4; Rm 2.11; Ef
6.9; Tg 2.9), por isso, devemos amar a todos (Gl 6.10; 1Ts 3.12), inclusive
nossos inimigos (Mt 5.44; Lc 6.27,35). “O amor não faz mal ao próximo. De sorte que
o cumprimento da lei é o amor” (Rm 13.10).
III. A IGREJA APOSTÓLICA
E A PRÁTICA DAS OBRAS DE MISERICÓRDIA
A igreja tem por
missão proclamar o evangelho visando o homem em sua plenitude (corpo, alma e
espírito), promovendo ações que visam atender suas necessidades espirituais,
físicas
e emocionais
(Mc 16.15; At 6.1-7; 1 Ts 5.23; Tg 2.14-17). Podemos dizer que as obras de
misericórdia são as ações caridosas pelas quais ajudamos nosso próximo instruindo,
aconselhando, ajudando, consolando, ensinando, corrigindo, e
confortando (Mt 4.23-25; 28.18-20; Mc 1.14,15; Lc 11.20; Jo 17.18;
20.21.). Não podemos confundir as obras de misericórdia que cada crente pode e
deve realizar individualmente com as obrigações que cabe ao Estado prover com
o devido recolhimento dos impostos. Assim, devemos entender que a assistência
social não se restringe apenas a atender o homem em suas necessidades físicas e
materiais (como afirmam a Teologia da Libertação ou Teologia da Missão
Integral), mas, envolve também atividades e ações que viabilizem a inclusão
social de modo geral. O projeto Samuel bem como também o CERELF desenvolvido
pela IEADPE é um grande exemplo de como a Igreja promove a ação social sem
confundir seu papel com o do Governo. Notemos estes aspectos na Igreja
primitiva:
1. A Igreja primitiva como modelo das boas
obras.
Na Igreja
Primitiva, era comum, não só a pregação do Evangelho, mas também a prática de
ajudar aos irmãos pobres em suas necessidades (At 2.43-46; 4.34-37). Foram
escolhidos sete homens cheios do Espírito Santo e de sabedoria para executar
esta importante tarefa (At 6.1-6). Diversas vezes houve coletas entre os irmãos
com o objetivo de socorrer aos santos que estavam enfrentando dificuldades (Rm
15.25-27; 1 Co 16.1-4; 2Co 8; 9; Fp 4.18,19). Paulo e Barnabé, representando a
igreja em Antioquia da Síria, levaram a Jerusalém uma oferta aos irmãos
carentes da Judeia (At 11.28-30). Paulo afirma que recebeu recomendações de
Tiago, Cefas e João, “as colunas”, para que se lembrassem dos pobres, e ele
mesmo diz que procurou fazer com diligência (Gl 2.10 ver Rm 15.25,26; 1 Co 16.1-4;
2 Co 8.1-4).
IV. AS OBRAS DE
MISERICÓRDIA COMO EVIDÊNCIA DA SALVAÇÃO
O livro de Tiago
nos fala da fé e das obras (Tg 2.14-26). Ele diz que Abraão foi justificado
pelas obras (Tg 2.21), ao passo que Paulo ensina que ele foi justificado pela
fé (Rm 4.9-b). Alguns estudiosos creem que Tiago estivesse refutando Paulo o
que não é verdade; apenas ambos os apóstolos estão tratando da mesma doutrina
sob aspectos diferentes. A abordagem de Paulo se dá no sentido vertical (diante
de Deus) onde o homem é inocentado por fé e não por obras (Rm 5.1). Já o ponto
de vista de Tiago se dá no sentido horizontal (diante dos homens), visto que as
obras que o salvo pratica são um claro testemunho diante dos homens de sua real
transformação (Mt 5.16). Notemos que ambos pontos de vista se harmonizam:
1. As obras de misericórdia na perspectiva de Paulo.
Paulo ensinou
que o homem é “justificado pela fé independente das obras” (Rm 3.28; 5.1; Gl
2.16). Embora o apóstolo enfatizasse a
fé como base para justificação, ele não está menosprezando as obras que
evidenciam a salvação (Fp 2.12,13). Logo, fica claro que, embora tais obras em
nada contribuíssem para a justificação de uma pessoa diante de Deus (Rm 3.28;
Ef 2.8,9), a verdadeira fé opera pelo amor resultando em boas obras (Gl 5.6; Ef
2.10). Certos grupos libertinos que vieram depois de Paulo, levaram seus
ensinamentos ao extremo. Estes afirmavam que, desde que uma pessoa tivesse fé
em Cristo não importaria se os atos dela fossem bons ou maus (Rm 6.1,2).
2. As obras de misericórdia na perspectiva de Tiago.
Tiago ensinou
que o homem é justificado “pelas obras e não somente pela fé”
(Tg 2.24). O apóstolo está ensinando que embora a pessoa seja salva pela fé
somente, a fé que salva redunda na prática das boas obras (Tg 2.22-26). Tiago
declara que a “fé sem obras é morta” (Tg 2.14-16). A fé, para a salvação, é
uma fé tão vital que deve ser evidenciada diante dos homens, em amor e
obediência para com o Salvador e no serviço ao próximo (Tg 1.27; 2.1-9; 14-20).
Tiago continua comentando sobre este assunto ao dizer: “A religião pura e imaculada para
com Deus, o Pai, é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações...”
(Tg 1.27a). O cuidado pelos órfãos e as viúvas é uma ordem do AT como uma forma
de imitar o cuidado do próprio Deus com estas pessoas, “pois ele é o pai dos órfãos e
defensor das viúvas” (Sl 68.5; Is 1.10-17). Jesus condenou os escribas
e fariseus que exploravam financeiramente as viúvas (Mt 23.14; Lc 20.47).
Devemos honrar e cuidar das verdadeiras viúvas (1 Tm 5.3; At
6.1; Tg 1.27).
V. A
RESPONSABILIDADE DO CRENTE NO CUIDADO COM OS POBRES E NECESSITADOS
Do ponto de
vista de Tiago o cristão verdadeiro é aquele que não despedi o necessitado
somente com palavras (Tg 2.15- 18). Quanto a prática da benevolência com os
carentes, Tiago deu as seguintes exortações:
1. Exortação à assistência aos órfãos e viúvas (Tg
1.27).
Nos dias do NT,
os órfãos e as viúvas tinham poucos meios de auto sustento; em muitos casos,
não tinham ninguém para cuidar deles. Esperava-se da parte dos crentes que lhes
demonstrassem o devido cuidado. Devemos procurar aliviar suas aflições e
sofrimentos (Lc 7.13; Gl 6.10). “O termo visitar usado pelo apóstolo em Tiago
1.27 no grego ‘episkeptomai’ indica mais que uma mera visita. Também indica a
manifestação de simpatia e as dádivas para aliviar as necessidades” (CHAMPLIN,
2005, p. 33).
2. Exortação a caridade para com os pobres (Tg
2.15-17).
Nos referidos
versículos Tiago cita agora um outro exemplo: o “mal vestido e o faminto”
que provavelmente alude a um irmão ou irmã, isto é, um membro da comunidade
cristã que também pode passar por privações, mas que aquele que diz que “crê em Deus” deve socorrer estes irmãos
necessitados não apenas orando por eles, mas agindo suprindo-lhes as necessidades
(Tg 2.15,16). Do contrário a fé é inoperante e morta (Tg 2.19,20).
3. Exortação a prática da hospitalidade (Tg
2.25,26).
Quando Tiago
cita o exemplo de Raabe, a mulher prostituta de Jericó que acolheu em paz os
espias, porque creu no Deus de Israel (Js 2.11). O apóstolo Tiago e o escritor
aos hebreus citam-na como um exemplo de hospitalidade (Tg 2.25; Hb 11.31).
Houaiss diz que a palavra hospitaleiro “é a pessoa que dá hospedagem por bondade ou
caridade”. O escritor estimula os cristãos a serem hospitaleiros sob a
advertência de que “por ela alguns, não o sabendo, hospedaram anjos” (Hb 13.2 ver
também Rm 12.13; 1 Tm 5.10; Tt 1.7,8).
CONCLUSÃO
Deus usou de
misericórdia conosco, por isso, devemos usar de misericórdia com o próximo. Uma
das características marcantes da Igreja Primitiva era o seu altruísmo. Fazer
obras de misericórdias era um mandamento levado a sério pela igreja. As obras
de misericórdia, ou obras de caridade, nos mostra a disponibilidade de
desprendermo-nos do egoísmo e servir o próximo deliberadamente.
REFERÊNCIAS
Ø COELHO,
A; DANIEL, S. Fé e Obras: Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã Autêntica.
CPAD.
Ø BARCLAY,
W. Comentário
Biblico de Tiago. PDF
Ø STAMPS,
Donald C. Bíblia de Estudo Pentecostal.
CPAD.
Ø HARPER,
A. F. Comentário Bíblico Beacon. Tiago. Vol. 10. CPAD.
Por Rede
Brasil de Comunicação.
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