Hb 12.5-13
INTRODUÇÃO
É fato que a
igreja tem o direito e o dever de disciplinar os seus membros quando for
preciso. Tal autoridade foi-lhe dada pelo próprio Cristo, quando disse aos seus
discípulos (e por extensão à Sua igreja): “Em verdade vos digo que tudo o
que ligardes na Terra terá sido ligado nos Céus, e tudo o que desligardes na
Terra terá sido desligado nos Céus” (Mt 18.18). Assim, a igreja age em
nome e na autoridade de Cristo e o espírito por trás da disciplina deve também
ser o de Cristo de corrigir, elevar, restaurar, orientar, disciplinar e curar.
Aplicada à disciplina cristã, fica evidente que ela nunca visa um mero castigo
retribuidor, uma vingança contra o infrator, mas, visa “emendar” e
“consertar” um indivíduo que sofreu danos e ferimentos com o seu
erro.
I.
DEFINIÇÃO DA PALAVRA DISCIPLINA
1. Definição
etimológica.
Segundo Antônio
Houaiss (2001, pp. 1051,1052), a palavra “disciplina” vem do latim “discere”
e significa: “obediência às regras e aos superiores; submissão a um
regulamento; regulamento sobre a conduta dos diversos membros de uma
coletividade imposto ou aceito democraticamente que tem por finalidade o
bem-estar dos membros e o bom andamento dos trabalhos; ordem, bom
comportamento; castigo; penitência; mortificação; obediência ao regime,
diretrizes e orientações de um grupo ao qual é filiado”.
2. Definição
exegética.
No AT o termo
hebraico para “disciplina” é “musar” e significa “correção,
advertência, castigo” (Dt 11.2; Pv 5.12; 15.10). Já no NT a palavra
“disciplina” é a tradução dos termos gregos: a) “didaskalia” -
ensino, orientação (Mt 28.20); b) “paraklesis” - exortação (1Tm
4.13); c) “paideia” - educação, algumas vezes esse verbo é
também empregado com o sentido de punir, castigar (Hb 12.4-11), e também utilizado
para se referir à instrução de crianças (WILBUR, 1993, p. 153) de onde vem a
palavra pedagogia (VINE, 2010, p. 153), visa o mesmo que ensino, repreensão,
correção (2Tm 3.16); d) “nouthesia” - admoestação, advertência
(1Co 4.14); e) “elenxin; elenchos” - repreensão, punição, expor à
luz, convencer (Jo 16.8); f) “orthos” - retidão; “epannothosin”
- correção (2Tm 3.15-17; Ef 4.12) (SHEED, 2013, pp. 13-35). Muito
esclarecedora é a abordagem de Barclay (2000, pp. 119-120), no estudo sobre o termo
“katartizeim” onde afirma que um dos seus significados no grego
clássico é “ajustar, pôr em ordem, restaurar”. O Dr. Harold L.
Willmington (2015, p. 314), diz que: “Disciplinar é penalizar uma pessoa
por quebrar as leis de uma unidade de sociedade a qual pertence, com vistas de
restaurá-la a essas leis”.
II.
EXEMPLOS DE DISCIPLINA NO ANTIGO TESTAMENTO
A disciplina é tão
preciosa quanto à própria vida (Pv 6.23). Eis o que diz Salomão: “O que
ama a correção (disciplina) ama o conhecimento, mas o que aborrece a repreensão
é um bruto” (Pv 12.1). Como somos ainda pecadores e imperfeitos, a
disciplina na igreja é necessária. Por isso, uma igreja que não pratica a
disciplina vai se destruindo e pervertendo a doutrina. A disciplina é
necessária para que haja ordem e harmonia.
1. Israel
praticava a disciplina.
A primeira ideia
de disciplina está em Números 5.1-4, onde está prescrito que tudo aquilo que
fosse considerado imundo, deveria ser mantido “fora do arraial”,
tais como: os leprosos, os imundos e os que sofriam de hemorragia. Em
Deuteronômio, aparece nove vezes a prescrição disciplinar: “tirarás o mal
do meio de ti” (Dt 13.5; 17.7; 19.19; 21.21; 22.21,24; 24.7). O
sacerdote tinha autoridade de disciplinar os desobedientes (Dt 17.8-13). Além disso,
encontramos também na Lei, um complexo sistema de punições, cujo intuito é
reforçar os mandamentos divinos (Lv 25.23; Dt 4.36; Êx 20.20). Diversas
ocasiões no AT registram que Deus exerceu a disciplina por intermédio de um
juízo, como ocorreu com os desobedientes de Israel (Êx 32.25-29); Mirian (Nm
12.10-15); Acã (Js 7.1,19-26); Corá, Datã e Abirão (Nm 16.1-3, 30-35); Nadabe e
Abiú (Lv 10.1-11); Hofni e Fineias (1Sm 1.12-17; 4.11;17) e, Geazi (2Rs
5.20-27).
III.
EXEMPLOS DE DISCIPLINA NO NOVO TESTAMENTO
Podemos dizer que
a disciplina é uma das prerrogativas que Deus se utiliza para preservar a
santidade do seu povo, primeiramente com Israel, e, posteriormente, com a
igreja. Na prática, é uma atitude preventiva, formativa e corretiva, com
o intuito de tornar o povo santo, ainda mais santo. Assim, ao
estudarmos esta palavra, vemos que a disciplina cristã nunca é vingativa, mas
ela sempre é construtiva. A disciplina é um meio de purificação e santificação
da igreja. Notemos:
1. A igreja
primitiva praticava a disciplina.
A Igreja de hoje
não está dispensada desta obrigação. Divisões, heresias, imoralidades, etc. são
mencionadas como causa para disciplina na igreja (At 5.11; Mt 18.17; 1Co
5.6-8,13; Rm 16.17; 2Ts 3.6,14; Tt 3.10,11; 2Jo 10). Shedd (2013, pp. 53-67)
chama os exemplos a seguir de disciplina negativa: a) O
homem que cometeu incesto (1Co 5.1-8); b) A igreja de Corinto
(1Co 11.30-32); c) Ananias e Safira (At 5.1-11); d) Simão,
o mágico (At 8); e) Himineu e Alexandre (2Co 2.17-18; 1Tm 1.20); f)
Os hereges (Gl 1.9); e, g) Os que pecam para a morte (1Jo
5.16-17). Em 1Timóteo 1.20, Paulo informa que Himeneu e Alexandre foram
excluídos da igreja: “entreguei a Satanás” com o intuito de que “aprendam
a não blasfemar”. A exclusão deve servir como um tratamento de choque
para o crente que demonstra resistência em se arrepender sirva de exemplos para
os demais: “Desviai-vos deles” (Rm 16.17); “Que vos aparteis
de” (2 Ts 3.6); “Aparta-te dos tais” (1Tm 6.3,5); “Evita-o”
(Tt 3.10); “Não vos mistureis com ele” (2Ts 3.14); “Ele
deve ser entregue a Satanás” (1Co 5.5; 1Tm 1.20). A disciplina serve
também para ensinar a igreja que não se pode confundir amor com tolerância ao
pecado. As igrejas de Pérgamo e Tiatira estavam tolerando o erro ao permitirem
que pessoas que já haviam dado prova de uma vida incompatível com o evangelho,
fossem ainda membros de suas comunidades (Ap. 2.14,15,20). Jesus advertiu essas
igrejas, que devido ao não exercício da disciplina, Ele mesmo faria com que o
erro fosse punido (Ap 2.16; 21-24).
IV.
PROPÓSITOS DA DISCIPLINA NA IGREJA
O propósito da
disciplina é manter os padrões da Igreja diante de um mundo observador (Mt
5.13-16). Deus não deseja que a Igreja apresente o mesmo mau testemunho que
Israel uma vez apresentou (Rm 2.24). O uso da disciplina na Igreja é para: a)
valorizar a santidade (Hb 12.10); b) preservação da reputação
(Rm 2.23,24); c) repreender os transgressores (1Ts 5.17; 2Tm
2.24,25); d) restaurar a comunhão (Hb 12.12,13); e) gerar
temor nos demais (Dt 13.11; 17.13; Pv 19.25; At 5.11; 1Tm 5. 20), e, f)
evitar o juízo de Deus sobre todo o povo (Js 7.1,13; Ap 2.14-15). A
disciplina evita que o pecado se dissemine por toda a Igreja (1Co 5.6,7), e
ajuda o culpado a encontrar seu caminho de volta para Deus (2Co 2.6-8) (WILLMINGTON,
2015, p. 315). Ao lermos a Bíblia, podemos observar que a disciplina não é uma
invenção humana e muito menos um capricho da liderança da igreja. Vejamos pelo
menos três objetivos principais. Vejamos:
1. Testemunhar a
santidade de Deus.
A base da
disciplina de uma igreja local é a santidade de Deus (Sl 93.5; 1Pe 1.16). Deus
é santo e não pactua com o pecado (Êx 15.11; Lv 11.44,45; 20.26; Js 24.19; lSm
2.2; Sl 5.4; 111.9; 145.17; Is 6.3; 43.14,15; Jr 23.9; Tg 1.13; 1Pe 1.15,16; Ap
4.8; 15.3,4). A santidade de Deus significa sua absoluta pureza moral e,
através da disciplina, Ele nos revela Seu caráter e Sua santidade. A Bíblia nos
diz que o ímpio odeia a disciplina (Sl 50.17) e o tolo aborrece a correção e
quem lhe corrige (Pv 12.1; 15.12); mas, o sábio recebe a correção e ama ao que
lhe corrige (Pv 13.1; 9.8).
2. Preservar a
santidade do povo de Deus.
Deus sempre exigiu
santidade do seu povo (Lv 20.7; Nm 11.18; Js 3.5; 7:13; 1Cr 15.12; 2Cr 35.6; Is
8:13; 1Pe 1.15,16; 3.15; Hb 12.14). Deus, através da disciplina e correção,
sempre conduziu os transgressores ao arrependimento preservando, assim, a
santidade do Seu povo (Sl 119.67,71; Pv 3.12; Ap 3.19). A disciplina protege a
pureza da igreja e não permite que o Nome de Jesus seja difamado pelas pessoas
de fora. A igreja não pode permitir que o Nome do Senhor seja desonrado com o
erro de alguns de seus membros, da mesma forma que o nome de Deus era
“blasfemado” por causa do comportamento de alguns judeus na época de Paulo (Rm
2.17-24; 1Co 10.32)
3. Corrigir o povo
de Deus.
A autoridade
máxima para disciplinar reside em Cristo, que autoriza Sua igreja a exercitar a
disciplina quando necessário (1Co 5.4). Existem, pelo menos, três tipos de
disciplinas: a) disciplina preventiva que ocorre por meio
da exortação e compete a todos os cristãos (Hb 3.13), e que se destina a evitar
que os males surjam no meio do povo de Deus (Dt 28; 30.19,20; 1Cr 28.9; 1Co
6.12; 10.12; 10.32; Hb 3.12; 1Jo 2.1); b) disciplina corretiva que
ocorre por meio do afastamento do crente e compete aos pastores (2Ts 3.
6,14,15), e que tem por objetivo corrigir os transgressores (Js 7.1,19-26; Jz
4.1,2; 6.1; 13:1; Nm 16.1-3, 30-35; At 5.1-10; 1Co 5.5; 10.1-11), para que
outros não sigam seu exemplo.; e, c) disciplina cirúrgica ou formativa
que ocorre por meio da exclusão do crente e compete ao pastor e a
igreja (1Co 5.3-5; 1Tm 1.20). Na carta aos Hebreus 12.5-6, é dito que Deus toma
a iniciativa de corrigir os filhos que se desviam. No versículo 8 é mencionado
que sem disciplina não somos filhos, mas bastardos. E no versículo 11 é
descrito que o projeto de Deus na disciplina não é simplesmente provocar dor,
(embora a disciplina produza certa dor no cristão), mas fazer com que ele viva uma
vida que produza frutos que o glorifiquem (Cl 1.10).
CONCLUSÃO
A disciplina é
necessária para que haja ordem no Corpo de Cristo. Ela pode ser coerciva como
também educativa. Tanto no Antigo como em o Novo Testamento, o Criador sempre
disciplinou os seus servos, para que esses vivam em plena comunhão com Ele. O
propósito da disciplina na vida do cristão é, em suma, fazer com que este
cresça em santificação e viva uma vida frutífera para a glória de Deus. O
objetivo da disciplina cristã é proporcionar ao crente uma intimidade profunda
com o seu Criador.
REFERÊNCIAS
Ø ANDRADE,
Claudionor C. Dicionário Teológico:
Um suplemento biográfico dos grandes teólogo e pensadores. CPAD.
Ø DAKE,
Finis J. Bíblia de Estudo Dake: Anotações,
esboços e referências. Editora Atos.
Ø CHAMPLIN,
Russel Norman. Enciclopédia de Bíblia,
Teologia e Filosofia. HAGNOS.
Ø GINGRICH,
F. Wilbur. Léxico do Novo Testamento
Grego/Português. Vida Nova.
Ø WILLMINGTON,
Harold L. Guia de Willmington para a
Bíblia: Um ensino bíblico completo. ACADÊMICO.
Ø STAMPS,
Donald C. Bíblia de Estudo
Pentecostal: Antigo e Novo Testamento. CPAD
Ø VINE,
W. E. et al. Dicionário Vine: O
significado exegético e expositivo das palavras do AT e do NT. CPAD.
Por
Rede Brasil de Comunicação.
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